Com a recente adesão da República do Paraguai, a 15 de setembro de 2016 entrou em vigor o Acordo Ibero-Americano de Co-produção Cinematográfica (AICOCI), originalmente subscrito em Caracas a 11 de novembro de 1989 com a denominação de Acordo Latino-Americano de Co-produção Cinematográfica, tratado internacional que se manteve em vigor com esse título desde 1991 e que foi alvo de modificação a 14 de julho de 2006, através da subscrição em Bogotá de um Protocolo de Emenda inclusivo de umas Regras de Procedimento para a sua execução.
O AICOCI é um instrumento internacional concebido para contribuir para o desenvolvimento cultural da região e a sua identidade, e nomeadamente para dar impulso ao seu desenvolvimento cinematográfico e audiovisual, com particular ênfase naqueles países com infraestrutura insuficiente, no âmbito de um efetivo desenvolvimento da comunidade cinematográfica dos seus Estados-membros.
Um total de 14 países faz parte do Acordo original, e até à data, 8 fazem parte do Acordo que foi atualizado. No primeiro grupo estão a Argentina, Brasil, Colômbia, Costa Rica, Cuba, Equador, Espanha, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela; enquanto o segundo grupo inclui até agora Espanha, Uruguai, Colômbia, Brasil, Panamá, Costa Rica, Nicarágua e Paraguai.
Um conjunto de vantagens que irão favorecer as co-produções que surgirem entre os países ibero-americanos poderão então ser aplicadas a partir deste momento, como por exemplo os benefícios previstos no novo artigo número 2 do AICOCI, que refere que as obras a serem co-produzidas “serão consideradas como nacionais pelas autoridades competentes de cada países co-produtor, e usufruirão de pleno direito das vantagens e incentivos fiscais que sejam aplicáveis à indústria cinematográfica, que estejam em vigor ou possam ser promulgados em cada país“. A este respeito, é estabelecido que o reconhecimento e concessão destes benefícios serão feitos na base da reciprocidade e é aditado um parágrafo em que se ressalva que o Acordo não irá afetar outros aspetos da legislação dos países-membros em matéria fiscal nem os acordos existentes entre eles para evitar a dupla tributação.
Outro dos aspetos principais do texto reformulado que acaba de entrar em vigor tem que ver com a regulação das diversas variantes que podem ter lugar no que se refere às proporções de co-produção; as condições que as co-produções financeiras devem observar e também se especificam melhor as participações técnicas e artísticas.
Deste modo, é estabelecido que a proporção das contribuições dos co-produtores pode variar de 20 a 80%; que as co-produções não poderão ter uma participação superior a 30% derivada de países não membros da Conferência das Autoridades Cinematográficas Ibero-Americanas (CACI), mantendo-se a condição de que o co-produtor maioritário deva ser de um dos países-membros; entra também em vigor a disposição segundo a qual, caso um dos co-produtores seja de um país não-membro do Acordo, a participação dos países-membros não poderá ser inferior a 10%, enquanto que a maior, de um máximo de 70%, estando sujeito cada caso a análise particular de acordo com o Regulamento que a CACI estabelecer; além disso, o AICOCI estabelece que, quando se trate de co-produções multilaterais em que por um lado ocorram contribuições técnicas e artísticas e por outro, apenas contribuição financeira, a proporção do co-produtor financeiro deverá situar-se entre 10 e 25% do custo total da obra.
Outras disposições do AICOCI passam a regular a matéria relativa às contribuições e quantias mínimas, conseguindo-se desta maneira um esclarecimento muito útil na hora de determinar os vários elementos necessários para a formação das co-produções.
Estes ajustes, que desenvolvem e ampliam o previsto no Acordo de 1989, articulam-se em torno da obrigatoriedade de os co-produtores minoritários membros darem um efetivo contributo técnico e artístico à obra, que deve ser proporcional ao seu investimento.
A fim de melhor esclarecer os elementos técnicos e artísticos necessários para a composição das co-produções, é estabelecida a definição de pessoal criativo (pessoas na qualidade de autor, isto é, autores, argumentistas ou adaptadores, realizadores, compositores) e é precisado o âmbito técnico nos cargos de montador-chefe, diretor de fotografia, diretor artístico e chefe de som. É também esclarecido que a contribuição de cada país deverá incluir então, além de um ator ou atriz em papel principal, um ator ou atriz em papel secundário, um técnico qualificado, pelo menos um elemento considerado como criativo, podendo permitir-se que dois técnicos qualificados passem a cumprir alternativamente a condição que obriga a incluir um ator ou atriz no papel principal.
Por outro lado, o instrumento internacional agora em vigor regula também as co-produções bipartidas, prescrevendo-se que apenas se poderá admitir este tipo de benefícios caso a caso, após a autorização que as autoridades competentes deverão fazer, as quais só poderão aprovar co-produções bilaterais no âmbito do Acordo caso se cumpra uma série de condições, nomeadamente: a.- Qualidade técnica e valor artístico reconhecidos, condições a ser constatadas pelas autoridades cinematográficas competentes; b.- Custo igual ao montante que as autoridades cinematográficas dos dois países tiverem definido; c.- Proporção mínima de 10% e máxima de 25% para o caso de co-produtores minoritários que apenas participem financeiramente, podendo excecionalmente ser aprovadas percentagens superiores pelas autoridades cinematográficas competentes; d.- Cumprimento das exigências necessárias para a concessão de nacionalidade previstas na legislação em vigor no país maioritário; e.- Inclusão no contrato de co-produção de regras de distribuição das receitas.
Outro novo elemento que o AICOCI inclui nesta matéria é o requisito do cumprimento da reciprocidade para o usufruto do benefício da co-produção bipartida. Assim, é estabelecido que “o benefício da co-produção apenas será efetivo no país de que o co-produtor minoritário é originário, quando um novo filme, de participação maioritária desse país, tiver sido admitido pelas autoridades competentes em benefício da co-produção nos termos do presente Acordo.”
Igualmente, como parte integrante do instrumento internacional que entrou em vigor, as Regras de Procedimento para a sua execução foram também atualizadas e representam um conjunto de novidades adotadas para esclarecer, facilitar e tornar muito mais transparentes os processos conducentes à realização de co-produções. Assim, adota-se a disposição segundo a qual o pedido de admissão das co-produções e do contrato de co-produção perante as autoridades cinematográficas dos países co-produtores deve ser feito “simultaneamente”, e que tal depósito deve ser feito “pelo menos quarenta (40) dias antes” do início das filmagens.
Neste sentido, com o duplo objetivo de contar com os contributos específicos necessários para a avaliação adequada dos projetos de co-produção e oferecer maior margem de ação e interação aos co-produtores na concepção e desenvolvimento das obras, foi alargado o conjunto de elementos a serem indicados e incluídos no contrato de co-produção. Assim, à indispensável identificação dos produtores contratantes junta-se a do adaptador do argumento, caso se trate de uma obra baseada numa obra literária preexistente; para incidir no cumprimento dos efetivos contributos técnicos e artísticos deve-se anexar a lista do pessoal criativo e técnico, com indicação da nacionalidade e categoria do seu trabalho e, no caso dos artistas, deve indicar-se a nacionalidade, os papéis a serem interpretados, a sua categoria e duração.
As chamadas Regras de Procedimento para a execução do AICOCI incluem também outros elementos que procuram alargar as margens de gestão das co-produções e, nesse sentido, relativamente ao diretor permite-se a inclusão de uma cláusula de substituição para permitir a mesma em caso de necessidade; à exigência preexistente de indicação do orçamento por rubricas acrescenta-se o requerimento do plano financeiro e é também exigido que se estabeleça a proporção de participação que corresponde a cada produtor em relação à avaliação financeira dos contributos técnicos e artísticos de cada um; quanto à exigência preexistente de indicação da distribuição das receitas e da distribuição dos mercados, junta-se o requerimento de se estabelecer a distribuição de meios ou uma combinação de mercados e meios.
Além disso, é estabelecida a exigência de incluir três novas cláusulas nos contratos de co-produção, que indiquem: a.- as participações dos co-produtores em despesas excessivas e menores, que como regra geral inicial serão proporcionais às contribuições que tiverem feito; b.- as medidas a serem tomadas em caso de incumprimento de compromissos pelos produtores ou caso as autoridades cinematográficas competentes dos países co-produção rejeitem a concessão dos benefícios pedidos e c.- a distribuição proporcional da propriedade dos direitos de autor relativamente às contribuições dos co-produtores.
Por último, acrescenta-se como elemento a ser incluído a programação da produção, com indicação de locais e plano de trabalho, e prescreve-se com caráter excecional a possibilidade de substituição de co-produtores uma vez que a co-produção já tenha sido constituída.
Todas estas disposições que em conjunto entraram em vigor inscrevem-se na linha de estímulo aos processos de integração e cooperação regional do bloco ibero-americano de nações e constituem um passo muito importante na sua estratégia de modernização e crescimento.
O Acordo Ibero-Americano de Co-produção Cinematográfica (AICOCI) completa, em conjunto com a Convenção de Integração Cinematográfica Ibero-Americana (CONICI), a base jurídica e institucional constitutiva do Espaço Audiovisual Ibero-Americano, expressão da vontade soberana dos Estados-membros e Observadores da CACI em atingir progressivamente maiores saldos culturais, sociais e económicos dos seus povos.